E agora, Donatello? O caso do plástico nos ambientes marinhos




Saudações, cientistas preocupados com a natureza!

    Lanço aqui um desafio: identifique a referência no título dessa matéria e especule sobre a ligação dela com o tema de hoje. No fim do texto, teremos a explicação ^^ então fique ligado (a) até o final!!


   Muito provavelmente você já viu ou recebeu algo sobre os crescentes movimentos em relação a diminuição do uso de canudos plásticos...não?


                                                         Figura 1 – Meme tartaruga

   Pronto! Agora só falta saber se você adere ou “desmerece” o movimento.

   Brincadeiras à parte, o problema de materiais plásticos pararem nos ambientes aquáticos tem sido cada vez mais preocupante, ainda mais considerando os de alto consumo e rápido descarte, como é o caso dos famosos canudos de fast food (a tartaruga está vendo essa galera não distribuindo canudo, mas dando copo de plástico nos combos por aí).

   Segundo um artigo publicado na revista Science Advances, a produção global de plástico aumentou de 2 milhões de toneladas para 400 milhões, entre 1950 e 2015 e estima-se que 1 milhão de pássaros marinhos e cerca de 100 mil mamíferos e tartarugas morrem por ano por conta da poluição do plástico (representa cerca de 90% da poluição total dos mares). Além disso, as estatísticas levantadas num estudo de 2016 realizado pelo Fórum Econômico Mundial de Davos apontam que até 2050 haverá mais plástico do que peixes nos oceanos!
   Trazendo isso para o nível nacional, infelizmente os números não são bons, já que um levantamento feito pela WWF-Brasil aponta que o Brasil ocupa o quarto lugar dentre os maiores produtores de lixo plástico no planeta :( são 11,3 milhões de toneladas, sendo que de 10,3 milhões de toneladas coletadas (cerca de 91% do total), apenas 145 mil toneladas (1,28%) são efetivamente recicladas (obs.: a média global de reciclagem plástica é de 9%).
   Não é por acaso que “a tartaruga e o canudo” viraram símbolo dessa campanha, uma vez que o impacto físico mais óbvio entre plástico e fauna é justamente a ocorrência de ingestão desses resíduos, em maioria por mamíferos, aves, peixes marinhos e, claro, nosso réptil em questão: a tartaruga. Além de engolirem fragmentos ou até peças inteiras de plástico, alguns desses animais acabam se prendendo em, por exemplo, anéis plásticos, convivendo com aquilo por um bom tempo, o que restringe seu crescimento, ainda mais quando o animal se emaranha ainda jovem (Figura 2). Outro impacto físico é que dificulta alimentação e ventilação do animal, como é o caso do tubarão na Figura 3.  

Figura 2 – Tartaruga-de-ouvido-vermelho (Trachemys scripta elegans) com casco deformado devido ao aprisionamento plástico


Figura 3 – Tubarão da espécie Rizhoprionodon lalandii com as guelras obstruídas por anel plástico

   E não são só animais marinhos de grande porte que são afetados, porque a coisa fica ainda pior se considerarmos o microplástico. Com tamanho inferior a 5 mm (isso mesmo, meio centímetro) e podendo ser de origem primária  se provêm de resíduos industriais, residenciais e/ou de transporte marítimo,  ou secundária, quando vêm de processos de degradação que transformam pedaços de plásticos maiores em menores, os microplásticos abrem um enorme leque de impactos por terem maior alcance nas teias alimentares marinhas, atingindo mais grupos animais, uma vez que o fator condicionante do tamanho da partícula a ser assimilada é o tamanho da boca ou mecanismo de ingestão/filtração. Assim, moluscos e crustáceos, por exemplo, também interagem com o lixo marinho, gerando episódios de predação e até canibalismo não-naturais. É, melhor nem falar dos nanoplásticos.
   Há também os riscos químicos e toxicológicos pelo contato com substâncias abrasivas (usadas para polir, raspar ou desgastar superfícies), a ingestão e assimilação de compostos tóxicos no material ou adsorvidos nele. Em vista de fatores biológicos, os principais riscos estão no transporte de organismos bentônicos (que vivem no substrato/fundo de ambientes aquáticos) para áreas que suas larvas não alcançariam, também sendo um fator de risco o fato da microbiota associada ao item plástico se desenvolver com maior sucesso nesse substrato (alerta de contaminação!).
Figura 4 – Talheres no mar? Acho que a galera não precisa mais se preocupar em levar descartáveis pro piquenique na praia, afinal, é só buscar um desses lá do meio do oceano -.-


   Isso tudo desequilibra as relações ecológicas dos ecossistemas aquáticos, modificando interações, morfologias, diminuindo ou aumentando exponencialmente populações...e o que isso pode gerar para nós? 
  Além do impacto direto em comunidades que vivem da exploração de animais aquáticos para consumo, bem como indústrias que usam recursos provenientes da fauna marinha e dulcícola (lembrando que isso também deve ser feito de modo sustentável), a “cobertura” de plástico sobre os corpos d’água acaba obstruindo a passagem de luz, prejudicando a fotossíntese realizada pelo fitoplâncton, que é o responsável pelo título dos mares de “pulmões do mundo”, já que as algas ali presentes produzem grande parte do oxigênio atmosférico. Detalhe: o mar tem 6 vezes mais plástico do que algas.
Figura 5 – O problema impacta também no lazer...já imaginou mergulhar num local assim? Pela cara desse mergulhador, ele também não está nem um pouco animado com isso.

   E aí? Assustador, não? De repente aquela água de coco refrescante de praia  sugada pelo "alegre" canudinho colorido que tomamos nas férias  ficou amarga e pesada, né? Mas calma que a mudança tarda, mas não falha (mas vamos evitar ‘tardar” tanto, combinado?).
   Então quais serão as soluções? Queimar o plástico, como infelizmente ainda é feito com outros resíduos sólidos (ainda que na melhor das intenções) JAMAIS pode ser considerado como opção. O plástico é derivado do petróleo, ou seja, incinerar esse material irá liberar uma série de gases nocivos que poluem a atmosfera e afetam nossos sistemas respiratório e nervoso, além de irritar nossas peles e contribuir para a formação da chuva ácida, entre outras péssimas consequências. Ah, não existe remediação econômica ou tecnicamente viável para a retirada de microplásticos secundários, já sendo considerado um passivo ambiental (quando o impacto não foi corrigido ou compensado pela empresa, ou seja, a soma de todos os danos ambientais causados por elas e, consequentemente, a obrigação de repará-los), e fica realmente difícil imaginar ou executar a retirada de todo o lixo descartado nos ambientes aquáticos ao longo de tantos anos. Porém, há uma melhor perspectiva no controle das fontes de plástico em relação a sua produção e manuseio, e é aí que entram as medidas legislativas que os governos podem adotar para diminuir esse impacto, como é o caso da União Europeia ao aprovar uma lei na qual se proíbe itens de plástico descartáveis (talheres, pratos e canudos, etc.), sendo que o prazo para todos se adequarem a essa regra é até 2021, ou seja, depois disso não há desculpa para o descumprimento da lei, fazendo-se obrigatória a punição. Também é nessa questão de controle de consumo e manejo de produtos plásticos que está nosso papel de “heróis por um dia” (na verdade, pelo máximo de dias que pudermos).
   As indústrias são movidas pela demanda, ou seja, nosso consumo comanda a produção das empresas, dosando o quanto deve ser produzido para satisfazer o mercado de consumidores (ou seja, nós!)...assim, o movimento “fast food sem canudo de plástico” passa a fazer mais sentido dentro do contexto de que são redes altamente relacionadas ao consumo e produção de material descartável. Espera aí, isso quer dizer que você vai ter que deixar de comer seu maravilhoso combo de dois hambúrgueres, refri e batata frita? Apesar da preocupação com a sua saúde (considerando a frequência desse consumo, caro cientista amante da gastronomia fast food), isso não quer dizer que devamos parar totalmente de consumir junk food (em tradução livre, besteira mesmo), mas sim levarmos em consideração as posturas de indústrias e restaurantes que devem também tomar providências e criar alternativas para esse material de suporte, podendo oferecer outros tipos de recipientes de materiais menos poluentes ou até incentivando seus clientes a levarem os seus. Nossa mudança está em se atentar a pequenos hábitos que podem ajudar a diminuir o volume de plástico que chega nos corpos d’água. Como? Levando seus próprios copos, pratos e talheres no máximo de ocasiões possíveis, também tratando de descartá-los corretamente (quando for necessário) e apoiando os locais que já aderiram ao movimento de menos descartáveis plásticos. Além disso, por que não pensar e agir mais no clássico “reduzir, reutilizar e reciclar”?
   Vou deixar aqui o link de um site com diversas dicas, tutoriais e informações sobre a redução do lixo plástico. Sinta-se à vontade para explorar essa fonte de medidas mais sustentáveis:  Como reduzir e evitar plástico
   Viu só? Não é tão difícil assim ajudar o meio ambiente e, assim, se ajudar, certo? Sua ação pode parecer pequena perto das quase 7,7 bilhões de pessoas no mundo, né,  mas a cada um que adota esses hábitos, outros vão seguindo e aderindo aos hábitos até que se torne rotina e o padrão social, de um modo bastante positivo, consciente e necessário.

   Partiu fazer parte dessa iniciativa? Recomende esse post pra conhecidos e compartilhe da ideia! Sugestões, dúvidas ou recomendações? Entrem em contato!





Momento:




Resposta ao desafio: a referência está no nome "Donatello", mais especificamente no personagem do desenho intitulado "As Tartarugas Ninja", que é identificado por sua máscara roxa e personalidade marcada por usar muito do conhecimento para resolver conflitos, sendo o cientista, inventor, engenheiro e gênio tecnológico do grupo, justamente o motivo da escolha dessa referência no título da matéria.  

Autora: Isabel Cristina
Revisão: Ayrton Carvalhedo e Larissa Dias
Obs.: também compartilho da autoria deste post com meus colegas de graduação (e de vida, claro) uma vez que essa temática foi trabalhada num dos trabalhos da faculdade ^^ obrigada, Bru, Cla, Gio, Marck e nossa maravilhosa orientadora, Maria Teresa Berardo!

 
Fontes: BARLETTA, M., COSTA, M. F., IVAR DO SUL, J. A., LIMA, A. R. A. Contaminação do mar brasileiro por resíduos plásticos: impactos e perspectivas. 5º Congresso Brasileiro de Biologia Marinha, Porto de Galinhas (PE), 2015. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/277139620_Contaminacao_do_mar_brasileiro_por_residuos_plasticos_impactos_e_perspectivas.
CAMARGO, S. Neste verão, diga NÃO ao canudinho. Conexão planeta, 2018. Disponível em: http://conexaoplaneta.com.br/blog/neste-verao-diga-nao-ao-canudo/
MAGALHÃES, L. Passivo ambiental. Toda Matéria. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/passivo-ambiental/

Brasil é o quarto país do mundo que mais gera lixo plástico. WWF, 2019. Disponível em: https://www.wwf.org.br/?70222/Brasil-e-o-4-pais-do-mundo-que-mais-gera-lixo-plastico

GEYER, R., JAMBECK, J.R., LAW, K.L. Production, use and fate of all plastics ever made, Science Advances, 2017. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/318567844_Production_use_and_fate_of_all_plastics_ever_made


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